24.8.06

Aquela gente

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Sempre que vejo Fernando Pinto do Amaral na televisão, a minha segunda reacção é sempre a mesma. Achar que, mais do que professor universitário, poeta, crítico literário e figura da intelectualidade, a sua faceta mais marcante é a de peru vaidoso com dioptrias a mais. A segunda porque a primeira reacção (que também nunca varia) é conter o vómito. Mas estou consciente de que isso é um problema meu e de que tenho de aprender a não deixar aparições televisivas perturbarem-me a digestão.

Desta vez, Fernando Peru do Amaral veio à SIC Notícias para comentar a revista de imprensa. Começando por uma palavra de solidariedade para com Carlos Sousa, o autarca setubalense demissionário (porque os ícones da cultura também conseguem interessar-se pela política do homem comum), Nandinho voltou em seguida o seu olhar penetrante e hipnótico para a situação no Médio Oriente, referindo não ter dúvidas de que o Irão demonstra pretensões hegemónicas regionais que poderão desencadear um conflito sangrento a curto ou médio prazo, comparando o país do impronunciável Ahmadinejad à Alemanha de Hitler. E talvez tenha razão. Mas não conseguiu evitar referir também a preocupação que nele provoca o modo como "aquela gente" não tem medo de morrer devido ao lugar-comum do paraíso prometido e como uma guerra religiosa é mais terrível do que qualquer outra forma de conflito.

O que é mais preocupante aqui é a frequência cada vez maior com que figuras públicas das várias áreas não se coíbem de fazer referências aos árabes ou a todos os muçulmanos como "aquela gente", tomando a minoria disposta a usar coletes de explosivos pelo todo (os infindáveis milhões de gente comum que restam). E mais preocupante se torna se levarmos em consideração que não terão a mesma facilidade em usar expressões como "aquela gente" em relação, por exemplo, aos africanos ou aos asiáticos. Estabelecendo outro paralelo com a Alemanha de Hitler, talvez alguém consiga recordar-se de outro período na história em que se tornou moda demonizar os seguidores de uma religião e a etnia a ela associada.

Já agora, porque os paralelos saem mais baratos em conjuntos de três, não me parecia desajustado que Fernando Pinto do Amaral fosse obrigado a usar um emblema de pano colorido cosido às camisas (um losango azul-bebé, por exemplo). Não há nenhum motivo especial. Seria apenas por maldade e para aprender a não ser tão feio e esquisito.

PS-Hezbollah, mullahs, Hamas e outros maluquinhos de túnica e turbante habituaram-se a chamar "cruzados" aos países ocidentais que intervêm nos seus assuntos internos. E recorde-se que, naquela parte do mundo, os cruzados históricos não têm a aura positiva que têm na Europa, mas sim uma outra mais próxima da realidade, ou seja, a de fanáticos religiosos que invadiram terra alheia, matando e pilhando em nome da Cristandade. Continuando a vulgarizar-se este discurso e o fervor com que todos referem o choque de civilizações e a guerra religiosa, começamos, cada vez mais, a dar-lhes razão.