3.6.05

E os pobrezinhos? Coitadinhos!

Saiu esta semana no Expresso um artigo com o título "O défice sentido no bolso". Trata-se de uma espécie de ensaio sobre os Euros que os cortes orçamentais retiram à família Lopes.



O casal de professores expõe sem pudor os seus rendimentos e despesas mensais.
Entram nos cofres da família 2898 Euros por mês, 1498 da parte do pai e 1400 da parte da mãe. São 560 (miseráveis) contos, na boa moeda antiga. São depois apresentadas as despesas, onde se podem encontrar coisas como:
360 Euros para o empréstimo bancário (é um T5 duplex, com sótão aproveitado).
120 Euros para as aulas de inglês dos miúdos (são dois).
100 Euros para a empregada de limpeza.
100 Euros para livros e CDs.
57 Euros para a TV Cabo.

Tudo junto, a família tem 2069 Euros de despesas fixas. Com as novas medidas, vê este número aumentar para 2084 Euros, sobrando-lhe apenas 814 Euros para gastar em parvoíces. É quase o dobro do ordenado mínimo, uma ninharia!

Dizem também que, com esta coisa do défice, "se calhar vamos ter que adiar mais uma vez algumas coisas, como as férias lá fora", sendo que "foram de férias ao estrangeiro apenas duas vezes - uma semana à Grécia e uma vez a Paris". Realmente, não há justiça neste planeta. Como é que alguém pode viver se não pode fazer férias lá fora?!

O pai, revoltado por ver travada a sua progressão na carreira, diz que é "avaliado com o mesmo 'satisfaz' que o professor que ontem vi a dar uma aula no jardim da minha escola, com o jornal na mão". Não me parece que exista alguma tese a respeito das diferenças de produtividade e de interesse entre as aulas dadas em jardins e aulas dadas em salas escuras e bafientas. O mesmo acontece com a influência que têm os objectos que o professor traz na mão. Ainda assim, é evidente que os alunos se vão lembrar, até ao fim dos seus dias, do professor incrivelmente competente que deu 110 aulas, monocórdicas, como vem nos livros.

Expresso aqui a minha solidariedade para com a família Lopes, e aproveito para propor uma ou duas alterações ao algoritmo orçamental deste casal infeliz, que poderão dar uma ajudinha nos cortes orçamentais de dimensão familiar:

1. Transformar os 360 Euros do T5 duplex em 200 Euros para um T3 ou T4 simplex - 160 Euros.

2. Dispensar a empregada de limpeza. É uma actividade que pode ser vista como um desporto para a Srª Lopes. Não faz mal a ninguém e até dá para perder uns quilitos. O mesmo é válido para o Sr. Lopes - 100 Euros.

3. Os miúdos não andam na escola? Os professores de inglês são assim tão maus? Ou não havia vaga nos escuteiros? - 120 Euros.

4. Acabar com essas parvoíces da Sexy Hot e da Sport Tv. - 32 Euros.

5. Levantarem-se todos os dias e repetir dez vezes a frase: "Eu não sou uma vítima!". Poupa-se o que não se gasta no psicólogo daqui a uns anos. É uma coisa a longo prazo.

6. Ler um bocadinho mais devagar e ouvir o mesmo CD pelo menos duas vezes - 50 Euros.

7. Vão para fora, cá dentro. Talvez não ajude muito, mas pelo menos vão "lá fora".

E assim, sem grande esforço, se poupam 462 Euros. Se juntarmos aos 814 que já tinham, são 1276 Euros. Foi o melhor que se pôde arranjar.

Espero, sinceramente, ter ajudado. Proponho que se exclame um "Oh!" nacional, de pena, dia 10 de Junho, pelo meio-dia.

"A working class hero is something to be
If you want to be a hero well just follow me"

13 Comments:

Blogger Francisco opinou...

Este comentário foi removido por um gestor do blogue.

9:45 da manhã  
Blogger Francisco opinou...

Post fabuloso!! Digno do Back in Black do Lewis Black... Melhor ainda!

9:45 da manhã  
Anonymous Anónimo opinou...

Ai que o espesso está tão preocupado com a classe média. Ai.

3:58 da tarde  
Anonymous Anónimo opinou...

CANDIDATOS A PERSONALIDADES ESTÚPIDAS DO ANO

7:52 da tarde  
Anonymous Anónimo opinou...

E pergunto eu: Essas pessoas não comem???

11:35 da tarde  
Anonymous Anónimo opinou...

A.M.E.I. o post!!!Muito bem elaborado e com um humor inteligentíssimo! Realmente há gente que reclama de barriga cheia!!Vivem uma vida bastante fútil e ainda acham que é qualidade de vida e que tem o direito de exigir mais "mordomias"! Têm é o mecanismo cerebral com falta de corda é o que é...rsrsr..Quem precisa de empregada de limpeza, geralmente é gente ridícula, pobres de espírito. Os mais inteligentes sabem eles mesmo fazer as coisas. Trabalhem, trabalhem que só o trabalho vos libertará..aahahahha...e nada de sexy hot e play boys..Bem pensado!Ora toma!!
Dona Formiguinha

10:41 da manhã  
Anonymous Anónimo opinou...

Se considerarmos que para terem esses ordenados, que nem são nada do outro mundo diga-se, já passaram as 'passas do algarve' a saber: antes de terem ficado efectivos nas respectivas escolas penaram como muitos, foram o que chamamos 'turbo-profs' i.é, correram meio país até serem PQND. Fizeram estágios sabe-se lá onde, passaram pelas necessidades que muitos passam ou já passáram (não esqueçam aquela reportagem do prof de Vila Franca das Naves que com um ordenado semelhante a um deles vive num automóvel pq o € não dá para as despesas todas, pois é, isto não lembra quando é para desancar nos profs). Agora gostaria de saber se depois de muito penar um prof não é gente ainda. Será que não tem direito a mordomias? Será que um F Público tem que ser um pobre coitado a vida toda? Será que quem desancou não gostaria de estar com um ordenadito assim? Trabalhar, trabalhar, trabalhar: é que os profs fazem desde que se levantam até ir dormir pq, com muitos desconhecem infelizmente, o trabalho da escola ainda se leva para casa: aulas para preparar, pesquisas para fazer de maneira a que os alunios fiquem com a 'papinha pronta', fichas de apoio pois os livros muitas vezes não as têm de forma a que se possam desenvolver os conteúdos correctamente, testes a organizar e , ainda, o trabalho de casa, da casa deles que tem que ser feito. Lamento que a classe esteja tão mal vista e que só olhem para o presente e se esqueçam do que se passa até se chegar a esse ordenadito, a essas mordomias... é realmente uma pena. Boa semana para si, um abraço

1:14 da tarde  
Anonymous Anónimo opinou...

Errata
onde se lê '...é que os profs...', deve ler-se '...é o que os profs...'; 'passáram' 'passaram'; 'alunios' 'alunos'; 'PQND' 'Professor do Quadro de Nomeação Definitiva'.
Esqueci ainda, a correcção dos testes, preparação de aulas de apoio, pois muitas vezes e, cada vez mais, os alunos não estudam, estão-se nas tintas e quem paga é o prof, testes de recuperação, reuniões por tudo e nada...
Devo informar que não sou prof. É profissão de desgaste que não quereria nem por decreto ou, por um ordenado de jeito coisa que eles não têm mesmo. Apenas, conheço de perto a realidade que muitos teimam em não querer ver, vá-se lá saber porquê.

1:27 da tarde  
Blogger Salustio opinou...

Não fui eu que escrevi isto mas achei que devia dizer qualquer coisinha a respeito dos comentários anteriores. Ninguém aqui disse que os professores não mereciam mordomias e, se calhar, até merecem mordomias que não têm. O que se criticou foi o tratamento dado à história destas pessoas, apresentando-as como exemplo típico de família portuguesa vítima da crise a passar dificuldades. Parece-me a mim que foi isso e até acho que foi muito bem feito.

4:56 da tarde  
Anonymous Anónimo opinou...

Lamento não ver a 'coisa' assim. Depois de voltar a ler o post fiquei com a mesma opinião que suscitou o meu comment

1:35 da tarde  
Anonymous Anónimo opinou...

Dona paciência, é pena não ter percebido o que Salustio disse. Porque se o casal tivesse juízo e o jornalista um palmo de testa, quem estava na fotografia era o senhor josé e a senhora maria que trabalham na mesma fábrica que não sabem se vai fechar para o mês que vem e mesmo assim fazem horas extraordinárias para mandar os miúdos à escola ali a 20 km de casa porque os livros estão caros apesar de pouparem uns euros com a horta onde depois do trabalho quando não fazem horas extraordinárias e aproveitando ainda o fim-de-semana cultivam umas coisitas e uma galinha ou um coelho. Esses sim, que vivem numa casa térrea à antiga, sem tv cabo, sem CD e sem livros porque foi coisa que nunca lhes "mostraram", iriam partir-me o coração. Estes, não. Tenho pena deles por não saberem o que têm - uma coisa sei que não têm: vergonha. Isto não conta para nada do que disse atrás, mas já agora fica dito - eu já fui professor, e muito aplicado.

um abraço a todos, pol

9:31 da tarde  
Blogger Elvira opinou...

Tadinhos!...

11:14 da tarde  
Anonymous Anónimo opinou...

Não vejon absolutamente nada no post que possa ser considerado um ataque aos professores, simplesmente parece-me que o objectivo era dizer que esta familia foi muito mal escolhida se o objectivo era mostrar familias em dificuldsdes por causa da crise.

2:59 da tarde  

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