No Alqueva, falta ainda construir treze barragens e não sei quantos quilómetros de tubagens para que aquele vasto lençol de água sirva para alguma coisa - além de se evaporar. São ainda muitos milhões de euros e muitos anos até que tudo fique pronto.
Mas não foi este o País embriagado que ergueu estádios quase da noite para o dia? Foi - mostrem-me mais um desígnio nacional e eu saco lesto da pistola.
Entretanto, o Alentejo e o resto da nação rural vão secando, longitudinalmente estirados como bacalhau ao sol. Alguns responsáveis (termo generoso) passam pela televisão e falam em medidas urgentes - é tudo sempre urgente, sempre ansioso, caramba. O Presidente, como é seu hábito, irrita-se em vão e contagia o cidadão. Os agricultores querem dinheiro e compensações. Tristes vacas atravessam o ecrã. Outro responsável acrescenta inutilidades. Volta o habitual conselho para poupar água - e parece que ela se perde mais é nas condutas de transporte. A meteorologia acena com meses terríveis. Vem aí o calor e os fogos abrasadores em plena época balnear. O noticiário ameaça entrar na apoteose do futebol.
Há qualquer maldição irrevogável em tudo isto. Começa também a doer-me a cabeça.
O programa do governo, segundo os analistas, é vago. Como o País. O governo, esse, paira num estado engraçado de silêncio e circunspecção. Tão novo e tão grave. E, todavia, imprudente: depois dos excessos ruidosos, faz-nos mal tamanha privação e tão de repente. Na ressaca santanista, ouve-se a erva ribeirinha crescer. Só quando lhe falam de medicamentos é que ele sacode lampeiro o seu torpor de estado.
Certamente temos de esperar. Mas antes, à cautela, vou comprar aspirinas na loja de conveniência ali da esquina.